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O SONHO ACABOU!

A noite sem lua e com o céu claro brindava todos com uma vista deslumbrante. A maioria das pessoas encerradas nos seus afazeres diários estava mesmo ligada a seus televisores.

Foi um breve apagão que escureceu a cidade e destacou as estrelas.

Olhei para cima, embevecido com o infinito. Meus olhos se enchiam de tristeza e medo.

Nada, porém, se comparava com a terrível angústia que transbordava no meu peito. Meus olhos se enchiam de lágrimas e eu chorava, paralisado e impotente ante a grandeza da vida! Estava triste, cansado, magoado, desiludido, sem vontade e sem rumo.

Eu, que buscava tantas respostas em diferentes caminhos, que buscava a razão de ser da minha vida, a missão que me competia, agora não sabia mais quem eu era! E não tinha a mínima ideia de que rumo estava tomando.

Havia um eu do passado, alguém alegre, inseguro, que buscava o conhecimento e o desenvolvimento espiritual. Alguém ambicioso que queria progredir na vida.

E tinha o modelo, o santarrão perfeito pregado pelo grupo pseudomístico ao qual me liguei. Alguém modesto, que aceitava todas as humilhações com um riso no rosto, alguém sem ambição que idolatrava a pobreza (basta o necessário).

Meus cabelos estavam brancos, eu já tinha andado por muitas religiões, estudado muito, buscado fazer os exercícios do grupo e me sentia cada vez mais triste e vazio.

Eu buscara com todas as forças entrar no molde de perfeição. Perfeição pregada pelo grupo. Um molde ao qual era impossível se encaixar. Era preciso negar a si mesmo, renunciar seu modo de ser, até que cheguei ao ponto em que eu não era o santo que queria ser e também não era eu mesmo. Tinha me perdido de mim nessa busca e me sentia profundamente infeliz.  Ninguém pode ser feliz quando não se aceita.

35 anos. Uma idade mágica. Nesse momento, a alma grita se você não cumpriu seu propósito nesta vida. Se você fugiu de sua missão, ela berra.

Eu estava ali, caído, impotente, cansado, perdido e profundamente triste!

Ver a verdade nua, perder as ilusões, é um processo dolorido, mas é o que nos faz crescer. Admitir um erro é difícil, ninguém gosta de fazê-lo, mesmo um erro pequeno. Agora, admitir um erro gigantesco, quando você tomou o caminho errado achando que era certo…

Admitir que os outros estavam certos e que você estava errado, isso é como arrancar um pedaço do peito. Muita gente prefere não admitir o erro a dar o braço a torcer.

É como cair do quinto andar de cara no chão. Dói muito! Mas foi ali, naquele momento, que vi com clareza toda a minha vida e pronunciei uma frase decisiva:

— Seja feita a vossa vontade!

Disse isso para o mestre que mora no meu coração.

Decidi que seguiria a ponta do meu nariz e mais ninguém. Apesar da mágoa e desilusão, senti como se um caminhão saísse das minhas costas.

EU ESTAVA LIVRE!

PODIA SER EU DE NOVO!

Não conseguia entender como fiquei tanto tempo em um lugar que só me fazia mal! Entre pessoas cuja maioria não gostava de mim. Mas havia um motivo e uma explicação, isso eu descobriria mais tarde.

Era um grupo esotérico dedicado ao “despertar espiritual”, em que as palavras escritas nos livros e pronunciadas nas palestras diferiam radicalmente do que se via na realidade de dentro do grupo. O grupo dos “santinhos que já estavam salvos” de todas as catástrofes do mundo era muito mais mesquinho e pequeno. Não pense que é fácil falar desses momentos dolorosos. Se dependesse só de mim eu me calaria, mas este livro foi escrito sob mandato superior e, por isso, faço este relato.

Na última reunião da qual participei, observei de forma mais fria e distanciada o comportamento do grupo. Um assunto qualquer era discutido sempre com forte ambiente emocional, onde se disputava os espaços. Um falava e o outro contestava de forma dura e irônica. O tom da conversa era tudo menos amistoso. A hostilidade era palpável. Terminado o embate, alguém disse: “AGORA VAMOS FAZER UMA PRÁTICA DE IRRADIAÇÃO DE AMOR À HUMANIDADE!”. AMOR!? Durante a reunião, eu tinha presenciado o tipo de “amor” existente no grupo. Aquela hipocrisia me enojou. Saí dali disposto a nunca mais voltar. Houvesse o que houvesse, eu estava pagando para ver.

No outro dia, fiz uma carta e me desliguei formalmente da instituição. Entrei pela porta da frente e por ela saí. O efeito imediato para mim foi uma grande sensação de culpa e medo e o afastamento de muitas pessoas que eu considerava amigos. Como éramos estimulados a nos relacionarmos apenas dentro do grupo, eu fiquei sem amigos em um momento decisivo de minha vida.

Na minha busca de liberdade, eu tinha me tornado escravo do medo e da culpa.

E agora voltava a buscar a mim mesmo e minhas respostas.

RÉGIS CAANABARRO

O CHAMADO DA ALMA

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